Conheça a teia ministerial do Brasil

Em tempos acirrados, perspectiva pode ajudar a ter uma ideia do que acontece.

Coletei os dados de quem ocupou os ministérios brasileiros desde a redemocratização do Brasil, em 1985, para observar alguns padrões. A principal observação que salta aos olhos é como alguns nomes estão presentes em vários governo, formando uma verdadeira teia.

(Por padrão, o Google Fusion Tables mostra apenas as 150 conexões mais representativas; aumente o número para ver mais ministros.)

https://www.google.com/fusiontables/embedviz?containerId=googft-gviz-canvas&viz=GVIZ&t=GRAPH&gc=true&gd=false&sdb=1&rmax=100000&q=select+col2%2C+col5%2C+col6+from+10ga6rkk0A9Zt_eZBRLn07Myu71xjVHCey9AkMtWl&qrs=+where+col2+%3E%3D+&qre=+and+col2+%3C%3D+&qe=&uiversion=2&state=%7B%22ps%22%3A%221_l_2s_d_g_-j_-i_q_29_1u_1_-l_2k_8_w_-18_4_-18_1d_36_1v_i_8l_-1b_-t_4o_1z_w_31_-7_-1e_29_3d_18_3u_-s_d_2u_-12_-18_4n_-14_6_9x_4_-15_9y_3j_-3_9q_1m_u_3j_31_1b_4c_-1g_-f_n_z_5_1w_-n_-1n_3x_3q_d_35_1a_-3_6f_36_28_9o_34_2h_7w_-j_-1h_6s_1c_14_37_-2_d_92_-4_1d_2v_29_-i_48_2h_-p_98_3t_1_34_1n_15_21_38_-k_1g_3h_-e_6d_38_1d_3n_26_2v_5z_1i_2j_1a_2g_2v_78_-1e_4_55_v_q_2_-1h_1u_27_-18_3e_6m_-y_-1i_9z_2v_2r_3f_33_-p_6y_2q_-q_2j_3p_-a_8r_3u_10_24_1p_2t_1e_-1k_-1_3w_3t_s_14_-1c_-1b_3e_3s_19_7a_-j_n_4z_3g_-m_4h_-b_-1p_5x_3x_l_9m_2x_-t_13_-1l_-11_7u_-1j_38_8w_-p_3q_7e_1x_2z_7s_2o_2z_2g_-1p_-a_99_3v_1r_4u_-1g_m_c_1_-2f_43_-1r_-l_18_43_7_k_41_f_j_-1r_-u_1y_-18_-1l_w_-1s_2z_1n_-14_3q_2f_-1l_-1a_2a_48_2_y_-1y_2p_1t_-2j_1v_19_17_2s_2l_9_r_10_5_1u_1f_48_m_6_1_24_15_46_x_2o_-v_41_1b_4d_1y_22_q_1i_x_-1w_3h_1i_o_1w_1j_r_2d_11_y_-2w_h_-25_-z_28_-e_3l_2m_-1n_40_p_1h_6_2q_-2y_20_20_4o_9_2i_4o_o_t_1n_-2_o_4q_-5_1k_2e_3v_1x_-34_17_1h_30_3x_2h_4w_14_1z_4w_-e_2t_k_-3h_2e_12_-3i_r_3x_3g_2p_-3g_21_1s_-o_4x_f_1m_-3i_0_-1r_4o_2r_1_-3h_23_3q_3z_s_43_-2_1o_-19_54_2k_5d_z_2d_-36_-n_1r_-1_58_m_55_1q_2n_-2q_4a_1u_10_-k_2b_3d_4k_7_1f_-x_5_-2k_41_2c_-2y_1d_i_-3a_-1z_25_2l_-1b_1v_1c_-o_v_-r_3e_16_64_-3_1q_w_5q_17_5y_-12_12_-w_-48_2s_2v_-43_z_-3o_45_b_1z_-4k_d_2g_-4c_1d_4q_-n_e_1_-4m_1p_-2r_5a_26_3m_-1e_1l_2t_5a_3_-4c_2x_9_3b_-3r_a_1e_-4o_u_l_3e_1m_-41_33_1c_4c_-z_%22%2C%22cx%22%3A113.62745245093504%2C%22cy%22%3A29.61267594545664%2C%22sw%22%3A1251.2202364015748%2C%22sh%22%3A580.6484053937492%2C%22z%22%3A0.7482475019664878%7D&gco_forceIFrame=true&gco_hasLabelsColumn=true&width=650&height=500

Os elos da teia são os ministros que serviram a mais de um presidente.

Reinhold Stephanes, quatro vezes ministro, conseguiu a proeza de servir duas vezes sob Collor, uma sob FHC e uma sob Lula. Nelson Jobim foi três vezes ministro: uma sob FHC, uma sob Lula e uma sob Dilma. Celso Amorim, que empata com ele, serviu a Itamar, Lula e Dilma.

Outras observações também são interessantes. Dilma foi a presidente que mais teve mandatos de ministro – um mesmo ministro pode ter mais de um mandato. Miguel Rossetto, por exemplo, teve 3 mandatos nos governos dela. Ao longo de seu governo, várias trocas ministeriais ocorreram em decorrência de escândalos de corrupção e dança das cadeiras da base aliada.

A cadeira que mais mudou de ocupante foi a da Agricultura: foram 27 vezes desde 1985. Quatro vezes nos governos Dilma, Lula e Collor, e oito vezes no curto governo Itamar Franco. Ou um a cada dois anos nos governos petistas, um a cada seis meses no governo collorido e um a cada três meses no governo Itamar.

Em seguida vem o ministério da Justiça, com 26 trocas de ministro. Foram 10 apenas nos governos FHC. É a pasta que mais mudou de ministro sob um mesmo presidente.

O político mais longevo em cargos ministeriais nos últimos 31 anos foi Guido Mantega. Ocupou três ministérios durante 3.888 dias, nos governos Lula e Dilma. Isso equivale a mais de dez anos e meio. O décimo-segundo ministro mais longevo, Raul Jungmann, voltou ao governo sob Michel Temer.

Onde fica a linha da pobreza?

Hoje, uma CPI do Parlamento sueco divulgou seus dados de pobreza. Mas o que é ser pobre na Suécia?

Lá, como no Reino Unido, um domicílio pobre é aquele cuja renda corresponde a 60% da renda mediana dos domicílios do país. A mediana é aquele valor que fica exatamente no meio se você coloca todos os valores numa pilha. Metade das casas é mais pobre que a mediana, metade das casas é mais rica. Na Suécia, 60% da mediana da renda é 10.682 coroas suecas mensais, ou US$ 1.586.

Ou R$ 2.829,52, que equivalem a mais de cinco salários mínimos brasileiros. Doze por cento dos suecos vivem com essa renda ou menos.

O aluguel mensal de um apartamento de dois dormitórios num bairro não muito central de Malmö, uma charmosa cidade no sul do país, custa 5 mil coroas suecas por mês (R$ 1.324,43). Isso custa 46% da renda de uma família considerada pobre na Suécia. Não é um bairro considerado pobre, mas fica a 15 minutos de ônibus do centro.

A linha da pobreza depende do grau de desigualdade de onde você está.

No Brasil, para entrar no Bolsa Família, uma família precisa ter renda menor que R$ 140 por pessoa. Se a única renda for um salário mínimo (R$ 545) é preciso ter quatro pessoas morando na casa. Pai, mãe e dois filhos já serve. Vive-se bastante mal dessa maneira.

Outra forma de definir isso é pelos estratos de classe social. Uma família pobre é uma família que não tem renda suficiente para ser de classe média – cujo primeiro degrau é a hoje badalada classe C. A Fundação Getúlio Vargas, usando dados do IBGE, definiu que essa classe começa a partir de uma renda familiar de R$ 1.200 mensais. Ou seja: pouco mais de dois salários mínimos. Numa família de quatro pessoas, isso dá R$ 300 por pessoa. Para quem precisa pagar aluguel, ainda mais em São Paulo, é pouco também.

Um terço dos brasileiros vivem com menos de R$ 1.200 mensais.

Segundo o Secovi, em janeiro o aluguel de um imóvel apenas regular de dois dormitórios na “zona B” da zona leste de São Paulo custava no mínimo R$ 11,14 por metro quadrado. É bastante longe do centro, e quem for se locomover de ônibus leva muito tempo para chegar. Digamos que o apartamento tivesse 70 metros quadrados. É apertado, mas não é incomum. O aluguel desse apartamento, segundo o Secovi, custaria quase R$ 780 mensais – ou 65% da renda de uma família abaixo da classe C.

Para tentar entender como funcionam essas desigualdades, gosto de prestar atenção nos vídeos do professor de saúde pública sueco Hans Rosling. Veja se não dá o que pensar.

São Paulo não é cidade para pedestres?

Uma motorista conseguiu a façanha de atropelar e matar, segundo amigos ouviram da família, um respeitado professor do Instituto de Psicologia da USP, César Ades. Ele estava fazendo caminhada na Paulista.

[EDITADO: Segundo o HC, o professor continua internado em estado gravíssimo. Não teve morte cerebral.]

Pedestres morrem mais do que ciclistas na cidade. Por estarem desprotegidos, se um carro bate neles, no mínimo se machucam mais do que o motorista.

A julgar pelo que se ouviu quando morreu a ciclista, vão colocar a culpa no professor. Quem manda andar a pé na rua? São Paulo não está preparada para o pedestre. Andar a pé em São Paulo é utopia, deslumbramento de quem foi à Europa e achou bonito.

Recapitulando: na semana passada, uma ciclista foi atropelada e morreu na Paulista. Alguns especialistas consultados pela imprensa foram rápidos em dizer que a cidade não está preparada para as bicicletas. Comentaristas no Twitter, blogs e seções de cartas também. Muita gente inteligente culpando os ciclistas por se arriscarem no trânsito paulistano – mais ou menos como culpar uma mulher estuprada por andar de saia curta.

Não adianta lembrar que em outros países os ciclistas têm espaço garantido no trânsito – vão dizer que é coisa de elitista, de quem foi à Europa e achou bonito. Não adianta lembrar que o Código de Trânsito prevê respeito às bicicletas – nem as autoridades de trânsito levam a sério essa parte da lei.

Em pior situação do que os ciclistas estão os pedestres. Os pedestres têm as calçadas, dirá um ciclista. Mas será que têm? Em muitos bairros, o pedestre precisa andar pelo meio da rua porque, além de estreitas, as calçadas têm obstáculos – muros recuados, bueiros abertos, carros estacionados, árvores na frente dos muros recuados e todo tipo de coisa garantida pela criatividade dos moradores do quarteirão.

Mesmo assim, calhou de o professor morrer justamente caminhando pela calçada mais decente de São Paulo. Porque precisa atravessar a rua de intervalos em intervalos, e alguns motoristas não podem parar quando o sinal fecha – seu tempo é muito precioso, o trânsito é guerra mesmo e guerra sem vítimas não tem graça.

Cá pra nós? O que falta é respeito.

E a numeralha, que motiva este blog? A prefeitura de Gilberto Kassab ficou devendo.

Eles têm, bem escondido, um sistema de estatísticas de saúde semelhante ao do Datasus. Complexo, mas excelente nas funcionalidades.

O problema é que ele precisa ter a alimentação de dados. A última alimentação foi em janeiro deste ano, com dados de 2009 e 2010. Não há dados de nenhum dos meses de 2011, e os de 2012 ainda são um sonho.

Muito conveniente em ano eleitoral, não?

[EDITADO: Via Twitter, a Secretaria Municipal de Saúde diz que não há conveniência eleitoral e que os dados de 2011 devem ir ao ar no segundo semestre deste ano. Quando, aliás, a campanha estará nas ruas. No Datasus, já estão disponíveis os dados de todas as outras cidades do Estado até dezembro de 2011.]

De qualquer forma, veja neste link minha planilha com os dados de 1996 a 2010, separados por tipo de vítima e tipo de algoz. Compare por si mesmo.

Ser homem-antena deve ser melhor do que catar latinhas

Causou polêmica no Twitter uma iniciativa apresentada no festival South x Southwest, no Texas (EUA): mendigos foram transformados em hotspots ambulantes de wi-fi 4G para acesso rápido à internet. Eles usam camisetas informando seu código pessoal, e o usuário paga usando SMS. O blog Vi na Internet, do Charles Nisz, resume o caso.

Saneel Radia, da empresa de marketing que idealizou o projeto, se antecipou às críticas, segundo o Tecmundo:

“A preocupação é que essas pessoas sejam vistas apenas como hardware. Mas, francamente, eu não teria criado isso se não acreditasse no oposto”

Tem lá seu sentido. Mas mesmo o sujeito ser visto como hardware já é um grande avanço em relação a como ele é visto em outras ocupações disponíveis para mendigos.

Se você acha que carregar antena de wi-fi é indigno porque atende a um luxo de um playboy, pense no grau de dignidade de juntar do lixo a latinha da cerveja bebida pelo playboy. Essa é a ocupação mais frequente para  mais de seis em cada dez moradores de rua de São Paulo, segundo o Censo da População de Rua feito pela prefeitura em 2010 (baixe aqui).

Veja aqui como as opções se dividem:

Os catadores de latinhas seguem uma longa tradição de reciclagem no ambiente urbano. São profissionais úteis, por mais desagradável que seja revirar o lixo. Quem leu o livro “O Mapa Fantasma“, de Steven Johnson, sabe que a situação já foi muito pior nos primórdios do urbanismo. (Leia o primeiro capítulo aqui.)

No meio do século 19, quando uma epidemia de cólera atacou forte no centro de Londres, a profissão mais bem-paga no ramo da reciclagem era a dos sujeitos que recolhiam os dejetos orgânicos depositados nos porões das casas. Cada um tomava um terço de garrafa de conhaque pra encarar o tirão. Dois terços de século depois, quando minha avó era jovem, ainda existia a figura do “cabungueiro” no Brasil. Outra classe de recicladores recolhia cocô de cachorro para vender a quem curtia couro.

Essas profissões, indignas, acabaram quando se teve um sanitarismo mais eficiente. Hoje, foram substituídos pelos catadores de latinhas, que vivem numa situação melhor do que a dos cabungueiros. Os catadores devem existir até que a separação do lixo seja realmente eficaz. (Sim, eu sei que você acha que isso é quase impossível – mas os londrinos que morriam de cólera também tinham ideias definitivas sobre o destino do seu esgoto em 1854.) Aí, quem vivia dessa atividade vai ter que arrumar outra, que provavelmente será melhor mas não sei se tanto.

Convenhamos, carregar antenas para vender acesso rápido à internet é bem mais digno do que ser cabungueiro ou remexer no lixo.

Ainda quero chegar a viver num mundo onde a profissão mais indigna que alguém possa ter seja a de carregar antena pra acessar a internet. O ideal seria nem isso ser preciso – mas o ideal, por definição, não existe.

Nova ordem mundial

Recebi hoje um email em mau português, de uma deputada que herdou uma fortuna do marido e quer doar para uma instituição de caridade cristã. O marido trabalhava na embaixada iraniana na Costa do Marfim. Está com câncer, coitada, e pede minha ajuda para ajudar a transferir a bolada para quem merece. Cita a Bíblia uma série de vezes, e sabe como é – cristãos e Irã não fecham muito bem. Por causa disso, a transação deve ser clandestina.

É claro que é lorota, e lorota perigosa. É uma nova versão do golpe nigeriano. Eventualmente você deve acabar recebendo algo do gênero também, se é que já não recebeu. A fraude já teve diversas versões, e a primeira que eu vi chegou por fax para um parente contador de empresa em meados dos anos 90. Ele não caiu, mas aqui no Brasil um pretenso esperto na diretoria do Banco Noroeste caiu no golpe e desviou US$ 242 milhões entre 1995 e 1998. Lá fora tem gente que morreu e que foi pra cadeia por isso. Em janeiro, um sul-coreano e sua filha foram sequestrados ao ir buscar o dinheiro na África do Sul.

Esse tipo de fraude joga com a ganância do cidadão – OK, a mulher prometeu depositar alguns milhões de dólares na sua conta, daqui a oito meses ela morre, ninguém vai saber se você não acabar doando pra uma igreja.

Só que do outro lado tem alguém mais esperto do que a vítima julga ser. Depois que o pato morde a isca, a rica viúva (ou algum sobrinho, ou sei lá quem) pede que ele mande uma soma relativamente pequena de dólares, algo como US$ 1000, para propinar alguém. O que são mil dólares perto de muitos milhões? Aí o esperto do outro lado vai subindo a aposta aos poucos, sempre com muita educação e apelando ao instinto de piedade do trouxa.

Geralmente, quando alguém cai nessa, demora a cair a ficha e pular fora. Nessa hora, já é tarde demais. Porque ele próprio já chegou ao ponto de cometer fraudes que o tornam sério candidato a ver o sol nascer quadrado.

O interessante nessa versão nova da fraude nigeriana é a roupagem.

Está em português, possivelmente por conta do bom momento econômico do Brasil. O mundo inteiro já reconhece o Brasil como um país caro. Um apartamento em algumas áreas de São Paulo custa mais caro do que um em Miami, carro popular é mais caro que um carro de luxo lá fora, a gasolina é mais cara do que em muitos países mais ricos e até a expressão “preço de banana” perde sentido quando se percebe que o quilo da fruta custa tão caro aqui quanto em Nova York. Um engraxate brasileiro nos EUA cobra mais barato do que seu colega daqui.

Fala no Irã, porque o Irã é a bola da vez na geopolítica internacional. Você conhece a fama do Irã de país fundamentalista e intolerante, brigando com os EUA. Imagina o que não fariam com uma pobre velhinha rica, viúva de um diplomata americano.

A fraude nigeriana se atualiza, mas nunca acaba. Porque a estupidez humana não tem limite. E o melhoir jeito de ser trouxa é se achando muito esperto ao topar uma oferta que parece boa demais para ser verdade. Geralmente costuma ser exatamente isso, mas a ganância desliga desconfiômetros – e torna a vítima tão culpada quanto o criminoso.

Isso acontece em outros contextos também, como no caso de gente que compra iPad por R$ 500 em site chinês de procedência duvidosa e recebe uma caixa de pedras em casa. Grupos do crime organizado exploram o mesmo bug quando mandam SMS dizendo que você ganhou um caminhão do Faustão e que precisa ligar para um celular do Ceará para acertar o recebimento dos prêmios. É o lado simpático do golpe do falso sequestro, mas o efeito é o mesmo.

Se você ainda assim achar razoável atender ao apelo da pobre viúva rica, fale comigo. Sei de um viaduto lindo para vender a você no centro de São Paulo, que pode ser seu a um preço imperdível.

Quer ganhar no bolão do Oscar? Entenda a cabeça dos jurados

Domingo temos a festa do Oscar, e o esporte favorito dos cinéfilos nessa época é tentar adivinhar quem serão os vencedores.

Se você quer vencer um desses bolões, porém, precisa deixar seu gosto pessoal de lado.
Os vencedores de cada categoria precisam agradar a uma quantidade suficiente dos membros da Academia (algo entre 250 a 300 votos) para vencer. Eles levam alguns critérios em conta, e conhecê-los sempre ajuda na hora de pensar nas probabilidades.
A revista Variety conversou em novembro com gente que conhece por dentro a votação do Oscar para ver que critérios são esses. Algumas dicas:
  • “O sistema recompensa filmes que são favoritos populares, ainda que só sejam favoritos de uma pequena minoria, ao invés de um flme que seja muito apreciado por todos, mas não seja o favorito de todos”, disse Cyntia Swartz, da empresa Strategy PR. Se é um filme que não desagrada ninguém, mas também não ganha corações e mentes, pode ter certeza: dançou. “Babel era um filme divisivo, ou você amava ou odiava. Mas pra quem amava era o favorito”, diz Tony Angelotti, descrito como “estrategista de Oscar”, seja lá o que for isso.
  • O timing é importante, tanto no lançamento quanto na narrativa. Se o filme foi lançado muito cedo na temporada, pouca gente vai lembrar e as chances caem. Se for muito longo, quem vota fica com preguiça (eles também têm preguiça de ler legendas, aliás). Durante o filme tem que ter um ritmo que surpreenda, que balance a audiência. “Se tem uma coisa que os indicados compartilham, de certa maneira, são momentos vistosos contrabalanceados com momentos mais quietos”, disse Dave Karger, da Entertainment Weekly. Filmes muito homogêneos – ação o tempo inteiro ou marasmo toda vida – tendem a impressionar menos.
  • Também influi o fator pessoal, para o bem e para o mal. O “pedigree” do diretor e do elenco pesa, claro – quem é aclamado tende a chamar mais a atenção. Mas, se o diretor é polêmico – nível Roman Polanski -, também reduz as chances. Mesma coisa se o tema for mórbido, mas isso às vezes varia dependendo dos outros atributos do filme.
  • Ah, sim: um filme sobre o qual pesem expectativas tem boas chances. Se as expectativas forem pesadas demais, porém, elas podem acabar jogando contra. “Você sente o balão desinflar. Tem sempre aquela coisa na última hora que transforma ‘mal posso esperar’ em ‘não tô nem aí'”, diz Mark Harris, editor colaborador da revista New York.
Na dúvida, ao preparar seu bolão, pense em fazer duas listas: uma dos filmes que você gostaria de ver ganhar e outra dos filmes que você acha que ganhariam de acordo com esses critérios. Depois, compare suas apostas com os resultados oficiais. Diversão garantida, ou sua pipoca de volta.

O ‘Top de Linha’ do jornalismo, edição 2012

Desde 2006, meu maestro soberano Philip Meyer é patrono de um prêmio de jornalismo que reconhece as reportagens de apuração mais complexa publicadas no ano. “O prêmio reconhece os melhores usos de métodos da ciência social no jornalismo”, diz a descrição oficial.

Semana passada, saíram os três vencedores da sétima edição.

Trata-se do “top de linha” do jornalismo. Esses trabalhos combinam levantamento de informações públicas, por meio do Freedom of Information Act, análise sofisticada de estatísticas e a sempre eficaz arte de sujar os sapatos.

Em termos de dinheiro, o prêmio Philip Meyer é modesto comparado até aos prêmios mais muquiranas dados no Brasil: US$ 500, US$ 300 e US$ 200, respectivamente, para cada colocação. O significado desse prêmio para o desenvolvimento do jornalismo, porém, é bem mais valioso. Na inscrição dos trabalhos, é preciso descrever todo o processo de apuração. É a complexidade da apuração, e não o produto final ou seu impacto, que pesa mais na avaliação. As descrições dos trabalhos ficam, depois, disponíveis para os sócios da IRE, para que possam aprender com a experiência dos colegas.

Vale a pena conhecer esses trabalhos, que forçam com louvor os limites autoimpostos ao jornalismo pela falta de conforto com os números. A minha lista completa, feita desde a primeira edição, está aqui. Estes são os vencedores de 2012, na descrição feita pela IRE:

 

1º LUGAR: “Mistérios de Assassinato“, Scripps Howards Service
Equipe: Thomas Hargrove

A série é um exemplo excelente do poder do jornalismo de precisão para encontrar padrões reveladores nos dados. Thomas Hargrove deu início ao projeto questionando se o Relatório Suplementar de Homicídios do FBI poderia ser usado para detectar o trabalho de serial killers entre os mais de 185 mil assassinatos não solucionados do país. Primeiro, ele descobriu que a polícia local deixava de relatar milhares de assassinatos ao FBI e passou meses usando as leis de acesso a informações públicas para levantar detalhes sobre mais de 15 mil assassinatos sem registro no país. Depois de construir o que especialistas consideram o mais completo banco de dados disponível sobre assassinatos não resolvidos, Hargrove desenvolveu um algoritmo único que usou a técnica estatística de análise de agrupamentos para identificar os traços de possíveis assassinatos seriais, com vítimas de características demográficas semelhantes sendo mortas de maneiras semelhantes. Em ao menos oito cidades, a polícia confirmou que os agrupamentos encontrados por Hargrove são casos confirmados de assassinatos em série ou têm chance de serem. O banco de dados foi colocado na internet para que os leitores possam fazer sua própria análise interativa dos assassinatos locais, e o banco inteiro está disponível para que qualquer um o baixe e explore. Ao menos um detetive amador usou os dados para encontrar um agrupamento que a polícia de sua região concordou ser o trabalho de um serial killer até então desconhecido.

2º LUGAR: “Testando o sistema“, USA Today
Equipe: Marisol Bello, Jack Gillum, Linda Mathews, Greg Toppo, Jodi Upton e Dennis Cauchon, (USA Today); Denise Amos (Cincinnati Enquirer); Chastity Pratt Dawsey, Peggy Walsh-Sarnecki e Kristi Tanner-White (Detroit Free Press); Anne Ryman (The Arizona Republic)

O projeto do USA Today examinou o crônico problema de escolas que trapaceiam em testes padronizados. Ao levar sua análise para o nível nacional, o grupo de repórteres e editores de bancos de dados laboriosamente obteve e limpou ao menos cinco anos de notas em testes e taxas de resposta e apagamento para seis Estados e para o Distrito de Columbia. Usando regressão linear e análise de variância, as escolas com aumentos suspeitos foram identificadas como estatisticamente fora do padrão e usadas como pauta para reportagem de campo. A série fez com que fosse aberta uma investigação federal do Departamento de Educação sobre as práticas das escolas da capital do país e a um reforço nos procedimentos de segurança dos testes.

3º LUGAR: “Um conto de três cidades: retomadas de imóveis nem sempre seguem o script“, The Seattle Times e Propublica
Equipe: Sanjay Bhatt (The Seattle Times); Jennifer LaFleur (ProPublica)

O projeto conjunto desafiou estereótipos comuns sobre retomadas de imóveis por conta de hipotecas pendentes, ao analisar e comparar os padrões demográficos e financeiros dessas retomadas em três cidades fundamentalmente diferentes: Seattle, Baltimore e Phoenix. Os repórteres identificaram uma amostra aleatória de 400 casos em cada uma das cidades, e depois usaram muita reportagem tradicional para obter detalhes de cada caso, cobrindo certidões, promissórias, bancarrotas anteriores e consequências da retomada. A análise do banco de dados resultante mostrou que, ao contrário do senso comum, apenas um quarto dos casos de retomada envolviam empréstimos que poderiam ser considerados predatórios, e que em mais da metade das retomadas os proprietários puderam manter suas casas depois que os  bancos concordaram em mudar as regras do empréstimo.

O campo de batalha da Web é o seu tempo

No Bubot, uma de nossas preocupações principais é como oferecer bons filtros para os usuários pouparem seu tempo na internet. Dois assuntos altamente comentados no Twitter ilustram um pouco onde queremos chegar com isso.

Ontem, durante o dia todo, vários amigos tuiteiros passaram fazendo piadinhas com o nome de uma garota que foi morar no exterior. A frase dita pelo pai da garota num comercial de empreiteira no Nordeste virou meme. Embora a maior parte das brincadeiras tenha sido em tom crítico, certamente os publicitários que fizeram a campanha estouraram champanhe ontem. Viralizou. Em menos de duas horas já tinha portal noticiando que a família anunciou a volta da garota ao Brasil. Aposto que vai ser um evento de repercussão nacional a chegada dela ao aeroporto.

Ao longo do domingo e segunda, o Twitter foi inundado de mensagens a respeito do que acontecia sob os edredons de um programa de alta audiência. Foi abuso sexual ou não? Deu polícia e tal. Houve portais que resolveram transformar isso em seu único assunto durante três dias. Resultado: 80% a mais de audiência para o programa criticado. Oitenta. Por. Cento. A. Mais. Sucesso, sem dúvida.

Existe um conceito que pouca gente entende na internet: o da economia da atenção (surgido neste livro interessantíssimo, há 11 anos). Há um bom artigo no Read/Write Web a respeito, mas vale a pena dar uma olhada no que significa em bom português.

O princípio fundamental da economia é que os desejos são infinitos mas os recursos são escassos. A economia é a ciência severa da escassez. Num mundo em que as formas de deixar o tempo passar são abundantes, o recurso mais escasso é o seu tempo. Você aloca seu tempo usando uma moeda chamada atenção.

Assim como na economia de reais você pode decidir se vai à balada ou se bota o dinheiro na poupança para usar depois, na economia da atenção você decide a todo instante o que fazer com seu tempo. Você pode assistir TV ou ler um livro ou curtir a família. Você pode prestar atenção no seu trabalho ou retuitar memes da internet.

“Tempo é dinheiro” é uma equação inversamente proporcional: se você tem pouco tempo, você gasta mais dinheiro (ir a um compromisso de táxi versus ir de ônibus); se você tem tempo sobrando, gasta menos dinheiro (espera para comprar passagens de avião quando há uma promoção). Geralmente somos mais ricos em tempo do que em dinheiro. Exatamente por isso tendemos a gastar mal essa moeda.

Assim como na economia de reais, a atenção “non olet”. Para o lojista do shopping center, não importa como você ganhou seu dinheiro; o que importa é que ele entre no caixa. Na economia da atenção, não importa se a atenção é positiva ou negativa. O que importa é fazer barulho, o que se traduz em cliques, vendas e pontos de Ibope.

Rebecca Black descobriu isso do jeito mais doloroso possível para uma menina de 13 anos. Ela gravou um clipe bobinho, infantil (afinal, qual era a idade dela, mesmo?), feito com a grana dos pais. Caiu na má boca do povo – teve 55 milhões de acessos em menos de um mês, com 90% de avaliações negativas e pilhas de sátiras. Mesmo com tanta vibe ruim, rendia R$ 27 mil por semana com vendas no iTunes e anúncios no YouTube. Em 2011, ela lançou mais um clipe.

Que o diga Avnash Kaushik, um papa da análise de métricas da Web, ao discutir as dificuldades de medir o “engajamento” do público online no livro “Web Analytics 2.0“:

“Dados quantitativos são limitados no sentido em que eles podem medir o grau de engajamento, mas não o tipo de engajamento.”

Ele define grau como um contínuo que vai da apatia (não vi, não cliquei) até o envolvimento acima da média com o objeto (passar o dia inteiro bombando a hashtag). O tipo é que pode ser positivo ou negativo, mas as métricas de Web não verificam isso. O clipe de Rebecca Black teve um alto grau de engajamento, ainda que do tipo negativo. Todos os 55 milhões que o assistiram viram impressões de anúncios do YouTube. Mais de 27 mil pessoas por mês compraram a música.

Com o que você gasta seu tempo? Já prestou atenção?

Existem algumas ferramentas como o RescueTime, que ficam no seu browser medindo o tempo que você passa em cada tipo de site. Os relatórios dele chegam a ser assustadores.

O tempo é efetivamente jogado fora quando você o gasta com algo de que não gosta. Eu conheço o sabor do prazer mórbido de falar mal das coisas de que não gosto. Afinal, eu era fã de heavy metal em pleno auge do pagode mauricinho dos anos 90, antes mesmo do Tchan. Mas naquela época falar mal não se traduzia em cliques e trending topics. Que são medidas de sucesso, enfim.

Em bom português: não gosta? Ignore, em vez de ficar criticando. Isso não significa que “é feio criticar”. Significa que a energia que você gasta criticando se traduz em sucesso para os fenômenos que você critica.

Na internet, “sua inveja faz o meu sucesso” não é frase de pára-choque de caminhão. É modelo de negócios.

Com o aumento da frota, caem mortes e dispara a invalidez

A Folha de S.Paulo publica hoje uma reportagem interessante, mostrando que quintuplicaram os pagamentos de seguro por invalidez após acidentes de trânsito. Foram pagas 31 mil indenizações em 2005, e em 2010 o número saltou para 151,5 mil.

Em novembro, o jornal já havia publicado reportagem sobre o aumento no número de mortes no trânsito. Levando em conta o aumento da frota de carros no Brasil, porém, a proporção das mortes caiu. Se em 2005 morriam 83,5 pessoas para cada 100 mil veículos circulando no país, em 2010 morreram apenas 62,5 pessoas para cada 100 mil veículos. Isso é positivo. Mas e como se comparam os inválidos a esses mortos?

Como jornais não costumam calcular esse tipo de proporção, ou mesmo cruzar dados de estudos diferentes, a nova reportagem não compara os casos de invalidez nem com a frota e nem com as mortes no trânsito. Fui atrás.

Na proporção da frota, em 2005 mais gente morria do que ficava inválida no trânsito: eram 85,5 mortes versus 73,9 casos de invalidez a cada 100 mil veículos. Em 2010, foram 62,5 mortes versus 233,8 casos de invalidez a cada 100 mil veículos. O gráfico fica assustador:

Boa parte desse crescimento nos inválidos tem a ver com o aumento da quantidade de motocicletas. Sete em cada dez dos inválidos por acidentes são motoqueiros e jovens, diz a reportagem. O motoqueiro está muito mais exposto a ferimentos graves do que o motorista – que, bem ou mal, está protegido deles por uma armadura de lata.  Na moto, mesmo sem o piloto morrer, ainda pode acontecer muita coisa ruim a ele num acidente.

O aumento das motos tem tudo a ver com o aumento dos carros: quanto mais carros, mais lento o trânsito; quanto mais lento, mais as empresas recorrem a motoboys para fazer entregas cortando pelo trânsito.

Considerando o tamanho da indenização paga (os mesmos R$ 13.500 para morte ou para invalidez permanente), quer-me parecer que quem morre se ferra menos do que quem fica inválido. Sem falar que a invalidez é para sempre, enquanto a morte é uma só vez. Se for considerar que o aumento das motos tem a ver principalmente com  cidadãos mais pobres que buscam um bico, pode ter aí inclusive um corte social desigual. É uma medida da crueldade da lógica do trânsito brasileiro.

Estes são os dados que eu usei:

Frota Mortes Invalidez Mortes por 100 mil Invalidez por 100 mil
2005 42.071.961 35.994 31.121 85,55 73,97
2006 45.372.640 36.367 45.635 80,15 100,58
2007 49.644.025 37.407 80.333 75,35 161,82
2008 54.506.661 38.273 89.474 70,22 164,15
2009 59.361.642 37.594 118.021 63,33 198,82
2010 64.817.974 40.610 151.558 62,65 233,82

As fontes:

A cauda longa das 500+ da Kiss

Todo ano, a rádio Kiss FM pede que os ouvintes votem nas 500 músicas que mais curtem na história do rock. Levantei os dados desde a primeira até a mais recente (2011), para ver quantas vezes as bandas aparecem em cada ano. Um dado curioso: em 2010, ano em que Paul McCartney veio ao Brasil, os Beatles tiveram seu recorde de indicações: 50.

O padrão é o da cauda longa: poucas bandas com muitas indicações, muitas bandas com pouquíssimas. Se a cabeça da distribuição é bem previsível, com Beatles e Queen e Led Zeppelin e Rolling Stones, lá pro final tem Ritchie Sambora e Ugly Kid Joe aparecendo uma só vez. Bandas que aparecem com 12 indicações ou menos dificilmente apareceram na lista em todos os anos.

Clique na imagem para ter acesso ao gráfico interativo.